segunda-feira, 26 de janeiro de 2015

A Gente Deixa Arrefecer

Não foi expulsa de escolas, mas de corações;
Arrumou briga consigo mesma, não com valentões.
Levou a vida louca de poucos por seguir loucos e vis padrões.
Empurrou à própria garganta sérias desilusões.

Cozinha tudo em fogo baixo porque tem medo de queimar
Mas deixa tudo cru; e antes de terminar
O período de esquentar o frio que entre as pessoas há
Sai caminhando alegre rumo a uma mesa de bar.

Depois vai deitar sem sono no colchão do esquecimento
Pra ver se alguém sai dos escuros caminhos barrentos
Que a mente traz de volta como um trágico minuendo
Que é resposta ao torpor de um amor em crescendo.

De amor por mitose, uma dose, por favor.

Amor por mitose
Não existe em Boa Vista,
Não há gente que insista
Só procuram por quem goze.

Amor por mitose
É raríssimo de achar
Mas um há de procurar
Ouso até dizer que goste

Amor por mitose
As pessoas o confundem
Com paixão de Hollywood em
Frações de menor porte

Amor por mitose
Divisão equacional
Da consciência invernal
Dos Joões que a vida cose.

De amor por mitose
Já tem vários desistindo
Estão felizes, lá, bulindo
O amor por meiose.

Ímpar

Finalmente escrevo como se deve escrever
Meu corpo é bainha para a espada que te lembra
Envolto na febre que gradualmente desmembra
A parte da lenda sobre esperanças do ter

Há mais sofrimento, é certo à la vento
E o peso anseia tolo por solidão
Quer tudo ter sem escrúpulos, mas são
E incomoda ao ser só por um momento

Amar é pífio se o amor é líquido
E se eu estiver quente demais
A par de evaporar os insípidos
Sabores de uma razão que jaz

Sob um espesso assoalho de paz
Através do qual ouço ruídos
De outro coração batendo; mais
Repetidamente que estribilhos

Chatos de canção famosa
Fracos com fome de prosa
Bárbaros de mão à mostra
Salvos de ir à pia rosa.

Ah, doce mentira
Que conto pro texto,
Pode algum cabresto
Apagar as frias

Condições
De viver
Pra valer
Sem sanções?

Sem
Dor
Sou
Bem

Com
Dor
Sou
Bom

O culto interrompido

Te escrevi poemas que se mesclaram a aventuras.
Te pensei, à beira; em meio amor deduras.
E atrapalhas meu culto à tranquilidade;
Jogaste em meu mundo de comodidade
Oxigênio em forma de dúvida


Pensava três vezes antes de agir
Acabava aliviado por não decidir
Deixava o acaso fazê-lo por em
Quanto que o tempo escorria pr'além
De um chão que deixou de existir


Em figura, momentos que de mim roubara
Folgados se mostram, se exibem na cara
Mania de do real te subtrair
E o saldo atual, m'amiga, contínuo a ruir
Dentre as de outros, a minha casca.

A música que ela é

Ela pintara esse sorriso bobo
na casca do ovo que ele diz que é
O engana o mané com promíscuas manias
E a certeza, a euforia mastiga com fé

Ao controle, um deles se obriga
O outro sabe, não liga; ele já se tocou
Quem dá 'oi' geralmente é quem chega
Quiçá a incerteza nem disso lembrou

O contrato diz "nada de laços"
Tal como os compassos da música ruim
Que compôs o aspirante a canalha
Já intitulada "Beleza em marfim"

O som calmo e agudo da flauta
E a paciência da gaita já foram dormir
'gora aqui toca um blues tão sonoro
Da parte do solo não quer mais sair.

Certo como a criação divina

Vejo o amor que tenho por ti em tudo que Deus criou
E é como o futuro, como o voto seguro
É como o belo e o feio, o preço de um veraneio
É como ciência e religião, como o conforto de um colchão

Será que vejo o amor que tenho por ti em tudo que Deus criou?
Parece o dinheiro que se há de ganhar, e o valor dos livros em que se pensa comprar
Parece com a estúpida fala e com a desnorteada bala
Com o acaso e com a sorte, e com a vida, mas não com a morte

Não vejo o amor que tenho por ti em tudo que Deus criou
É similar às teorias, às teses, às tentativas e à exegese
Ao tamanho do multi ou do universo, e aos assuntos que se julgam desconexos
E às premissas, e às respostas, e às missas e ofertas postas.

Deus criou tudo em que vejo amor por ti?
Lembra o tempo que vai levar pra alguém se embriagar
E pra, depois disso, dormir e se levantar pro serviço
E lembra, além de tudo, como é te ver e conseguir ficar mudo.

Quereres

Quer trocar bibliografias.
Quer ouvir discografias.
Quer tirar fotografias.
Quer fazer pornografias.

Quer ser d'outrem outra vez
Quer um elogio cortês
Quer chamar-se insensatez
Quer bastar-se a tudo, eu sei.

Quer sair da linha estrita
Quer voar por sobre a pista
Quer pra si a melhor vista
Quer a alíquota da vida.

Quer saber se tudo é tudo.
Quer olhar por entre o muro
Quer fugir sem ter seguro
Quer criar novos futuros.

Salgue o sarau!

Que tal um pouco de sal

no sarau

Pr'aquele que precisa de alma

Por estar em estado terminal

Sendo corroído e construído

Ao tempo que a vida sem manha

O apanha

E o priva ou da cobra ou da aranha

Temendo o vermelho

Calculando o azul

Recorrendo a entidades divinas

Recuperando feridas paulatinas.

Sonhar pra quê?

Sonhar pra quê, se eu já te tenho
Se todo dia à tona venho
E a alegria eu desenho
Dentro do meu peito?!

Com um sorriso à mostra
Um bater na porta
Duas peças tortas
Se unem num belo beijo.

Presos por um nó
Dando beijos de esquimó
Dentre os sentimentos, dó
Dos que nos olham desse jeito.

Quero te mostrar meu eu
Te dar o que já é teu
Tentar ser o seu Romeu
Nesse par perfeito.