quinta-feira, 11 de maio de 2017

Gotinhas

Imagina o desespero das gotinhas
Que sem ter decidido voam
Todas na mesma direção
Vítimas do mesmo vento soprado.


E o daquelas que se plaftam?!
E o das outras que se pluftam?!


Ninguém está nem aí pra elas
Quando escoam sua dor abaixo
Juntando suas quedas
Espatifadas do outro lado do vidro
Mas olham por meio delas
E nem as agradecem pela sua translucidez.


Imagina o desespero das gotinhas.
Agora imagina o meu.

Minha criança teimosa

Teima a criança em mim
E quer sair desprotegida
Pelas portas que o querer escancara:
As palavras e a afonia.
Minha carne é inflamável
E à minha criança fascina o fogo.
Não se sabe vulnerável
A ingênua de agir porfioso.

Quero a tua calmaria.
Quero a tua calmaria.
Quero a tua calmaria!

Ainda o apocalipse desconheces
Desinteressa-te a desgraça deste lado
Meu tragicômico tua curiosidade não vê
E todo dissabor é ignorado

Para de choro.
Para de choro.
Para de choro!

Oh, perdoe esta minha fraqueza
Ela foi mimada pela mãe (natureza)
Não consigo dar custódia
À minha criança teimosa

Engole o choro

Engole o choro, menino
Que nem tua é a noite.
A força do teu jeito é magra
A lágrima do teu sono é podre
Ainda nem são 5 e dormes
Em pé te vêm as perdas
Tosses o teu desgosto
Rosto teu pronto é rosto?


Saiba que a felicidade doutro sonho
Prensa a tua contra a tristeza
E avistam-se fatiados sobre a mesa
Os teus planos mais pueris
No jantar amigo se comem amores
E saem dores pelo nariz
Em irados suspiros nasais que curam
Até as clausuras que não se cospem
E delírios que não escorrem
Nem por todo o suor que distrai
Pois, pelo mais que já te dizem e mostram
Por que não te mandas agora ser feliz?

Gargantas do leque de sol e lua

Hoje a cidade ressecou.
Grande! Eu também.
Ontem a câmara caiu do penhasco
E as folhas mortas que arrastam o mundo se aglomerando...
Eu não né, meu cachorro também não e minha prima distante
É o filho do borracheiro que roubou um real!
Não prestas atenção! Falo de coisa maior:
Faz frio para a nossa determinação.
Só não esquenta porque não esquento a cara deles.
O clima está chuvoso, mas no Globo hum é primavera.
Flor é coisa de vagabundo meu amigo
Arma sim é bom e seguro
Faca na caveira e bala no mundo
Quero ver quantos bandidos sobram.

Cartas Marcadas se renovam.
Claro que não. Não vai sobrar um!
Ainda há escadas misteriosas naquele muro.
Foi culpa da segurança, não me venha com essa.
O caos aqui é adulto; aumenta seu próprio valor.
Mas o Senador, o beco, a culpa é deles!

Me diz se não é
Diz

E também da esquerda
Diz

É essa corja toda
Diz


Diz que não sou eu.


Terminado em 12/07/2016

Saudade III

Respirei intensidade
Visitei experiências
Conversei com lugares
Me apaixonei por crenças


Vivi pessoas

Tramitei melodias
Atravessei canções
Negociei comidas
Animei tradições
Pulei de outra vida
Empurrei ficções
Saí da Ilíada
Resgatei dragões


Escrevi pedrinhas
Regulei hormônios
Excluí mandingas
Limpei sonhos


Menti pra pontes
Fechei retratos
Engoli montes
Acreditei em chatos
Superei fontes
Agradei olfatos


Amei ódios
Trabalhei panelas
Criei pódios
Tranquei donzelas

Saudade II

Respondi à minha casa
Que não queria ficar
Trouxe-me, então, inteiro
Para aos cantos me doar


Fecho a porta do céu
Todos as noites e em prece
Digo tchau, até mais cedo
E Coimbra não permanece
Nunca como a deixei
Quando dormi.


Tanto experimentei
Que experimento agora sou
O vento, o meu cheiro sente
A terra cultiva meu sabor
A água em meu suor se benze
O fogo se queima em meu calor


O sólido que eu era
Diluiu-se na sua liquidez
Que parte de mim é mundo,
Que parte do mundo me é ex?


E o espírito vaga, sai vago
E volta cheio de coisas pra escrever
Canta-me ao som de um fado
As belezas que há no adeus
As certezas que estão de lado
As purezas que não vi nos meus
As proezas de ser vivo e parvo
As riquezas que o olho esqueceu.


 Ah, algumas coisas sei sim
Sou muito mais os outros
E muito menos mim
Desde que me comecei em ti
Que primeiro teu sol eu vi
(Sol de todos os dias leves
Que nasce por cima do enfim)
Pendurar-se às tuas casas
Se forçando a aguentar o doer
- Dor que sinto mais forte porque
A partir de amanhã pode ser
Que eu nunca mais te veja -
Que inveja do sol:
Volta toda quinta e terça. 

Toda

O fogo que guardas no peito
Lareira me é sem ser incêndio
Meu corpo, aconchega-o inteiro
Me esquenta assim sem me queimar
Em meu quintal faz a fogueira
Da qual ao redor canto e danço
Acende os foguetes que lanço
Se penso que te vi chegar
Clareia dali a varanda
Em que te pretendo sentada
Contando historietas passadas
Futuros a romantizar.

O gelo que guardas no peito
Congela-me? Não, é refresco
O pego na mão, massageio
Os baques que a vida me dá
Esfria bem minhas bebidas
Reflete-me os melhores traços
- Revisto-me em muito agasalho
Se muito gelado ficar
Suporto até menos cinquenta
Pra seres tu meu sonho bom

Visto vinte e dois moletons
Sim, visto, é só precisar.

Saudade I

Antes que o mês acene, quero
Que tu, tempo, no teu trono, escutes
Que te atentes ao meu pedido
E único penar:
Saudade se não me mata
Certamente me matará

Sabes - creio - do que falo
Pois não é tudo feito de ti?
Não tem tudo as tuas partes?
Criaste, então, a saudade!
E, ora, por que fizeste
Tão fugaz o bem-sentir?

Esta é a minha oração, tempo
Mas sofro que desaprendi a orar
Perdoa este cataclismo
Faz desta distância-abismo
Um minutinho só de longe
Que meu povo quer se achegar.

quarta-feira, 10 de maio de 2017

És corpo


És corpo
E é por ser corpo
Que dói
É por ser torto como todo corpo
Que se mói a perfeição
É por ter rastros de amassos
(Passos gastos com solidão)
Que escutas vozes do desgaste
Em toda somatização


És corpo, querida
E por ser corpo, no entanto
Em meio ao soluço do pranto
Aqueces a ti mesma em noite fria
És corpo, meu bem
E é por ser corpo, contudo
Que de tão rápido, absurdo
Curar-te-ias do mal que se prende.

Cabeça

Na cabeça era tanta coisa
Que pessoas ali não cabiam
Muitos 'tiveram à porta
Mas nunca a visitariam

"Esta é a minha bagunça
Converso com ela e me entendo
Não quereria que minhas joças
Te expelissem daqui tremendo
Como boa dona bem cuido
(Foram anos de acúmulo e panos)
De todas as minhas posses
Raras têm marcas dos danos
Imagina se alguém levasse
Depois de todos esses anos
Uma de minhas dessortes
Pra mim seria a morte
Desonra, vergonha, calote!
Mesmo que por engano"

- Sim, entre por favor
Só não repare a bagunça
Sabes que vivo sozinha
E que meu tempo se encurta
Fique mais que à vontade
Aceitas um vinho, um chá?
Conheça a cabeça uma hora
Enquanto eu não voltar
"Vá logo simbora, ome
Que tenho que cuidar
Deixe eu fazer minha boia
(hmm, arroz ovo e jabá)"

Voltei, se divertiu?
Mas nem se saiu do sofá!
Podia ter ido a Troia
Que não irias mudar
"Melhor que assim seja
Tudo no seu lugar"
Toma teu vinho agora
Fala, "faz, põe pra fora
Anda, amor, sem demora
É hora de te expulsar".

Formasidade do sentismo


Inescoadas saudades
Podem acompletecer a dor
A irrepetância das situações
Leva à sobreanimatura.

Desdesejos impermitidos
Empequenecem o coração decheio.

Efemerições confundem-se
Com permanecivas amoroses.

E meu sentismo assim se compõe:

Adoródio, paixodesprezo, inerciação.

terça-feira, 9 de maio de 2017

(In)felizmente humano

Tento conviver com minha mera humanidade
E por enquanto vivo as vidas do que virá
O limite da carne jamais me bastará
Pois sei que no corpo há tendências de sufoco

A forte mão do carrasco do meu braço é parte
Os chicotes do flagelo são minhas entranhas
O físico em invisíveis jaulas me tranca:
Só permite a mim olhar limitado e louco

Reprimo vontades de sobre-humanidade
Por enquanto o que virá me consome a vida
O espírito o tempo terreno desconvida -
A alma, semilivre em conflito barroco

O carrasco é até gentil quando tem arte
Os sonoros estalos acordam-me os sonhos
O tempo em clausura? Certamente reponho!
De dentro das grades o mundo é menos oco